sábado, 6 de outubro de 2012

Serpa tem um encanto especial para mim. Poucos conseguirão entender o fascínio que exerce em mim uma cidade que visitei - à séria - meia dúzia de vezes na minha vida. No entanto, quando chego a Serpa há uma familiaridade nas ruas, um conhecimento tácito da cidade - sem qualquer justificação - que me desarma. E o que eu gosto de cidades que me desarmam... Cidades que transcendem o espaço e o tempo, que marcam a "ferro e fogo" quem as percorre; cidades nas quais não vivemos, cidades que vivem, para sempre, dentro de nós. Gosto de levar essas cidades comigo, quando viajo, quando conheço novos lugares; gosto de ir coleccionando cidades e mundos dentro de mim na esperança de me tornar, também eu, um mundo rico e variado.
Há qualquer coisa nas cidades como Serpa que me cativa, talvez seja o ar antigo - adoro cidades com história, com um passado, com garra, com personalidade - ou talvez seja o facto de nada ter sido planeado, essas cidades aconteceram, foram crescendo sem obedecer a um esquema superior, sem respeitar uma régua e um esquadro; simplesmente nasceram da necessidade, da vida que dentro delas pulsava. Quando chego e entro na cidade há qualquer coisa que me prende. O avô adorava Serpa, o Guadiana. As pessoas que nascem perto de água parece precisar dela para o resto da vida, como se o corpo precisasse da água para respirar, para fluir. Ah, o que o meu avô gostava de passar o Guadiana, de olhar para o rio, de ver as pontes, de relembrar o que guardou bem fundo na memória. Foram tempos difíceis, tempos de guerra e fome, tempos de miséria e dor mas até esses tempos deixam saudade, porque nós éramos diferentes, porque um pouco de nós fica trancado nessas épocas e nada volta a ser como antes!
Lembro-me, com o saudosismo típico dos portugueses, dos piqueniques que fazíamos à beira-rio e da forma como contava histórias sobre aquela cidade muralhada. Talvez a forma como nos vendem algo marque, para sempre, a imagem que vamos ter sobre esse algo.
Sei que para mim Serpa, como Lisboa, como Évora soam sempre a muralhas, a fado e a noites sem dormir. Soam sempre a cantares nas tascas, a xailes para aquecer o coração, a noites vencidas. Soam a passado, a histórias, a tramas e enleios, a paixões avassaladoras... A vida!
Será sempre uma visão romântica, utópica até, mas é esta visão que me faz viajar. O tentar encontrar noutros lugares, em países distantes, a familiaridade que estas cidades exercem em mim...

Nas cidades que construímos hoje, a par com a modernidade temos a impessoalidade. É tudo pré-fabricado, chega tudo em caixotes e é só montar - qual estante do IKEA. As casas não guardam segredos, as paredes não escondem histórias de família e tudo acontece sem que nada de magnificente agite o mundo. Somos todos formatados para pensarmos da mesma forma, para aceitarmos tudo de igual modo. E quando algo diferente surge, uma nuancé nova aparece, prontamente aniquilamos a novidade, abafamos a mudança e colocamos o comboio, outra vez, nos eixos.
Falta-lhes identidade, genuinidade, falta-lhes a identificação com toda uma história, o suor dum povo.

O que nos falta, enquanto humanidade, perceber é  que a modernidade não deve nunca aniquilar o passado, a história, a arte. Falta-nos perceber que aquilo que herdámos não é nosso, apenas temos o dever de cuidar para que os outros que venham depois de nós também possam usufruir. Mas isso já são outros quinhentos...

Enfim, algures durante esta semana surgirá um post com fotos de Serpa, garantidamente! Aquela que o meu avô tanto amava e que me cativou!

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